Charanga Rubro-Negra: O Ataque das Múmias
Olá, rubro-negros!
Reza a lenda que pouco antes da Copa de 1950 o Flamengo perdeu um dos seus maiores ídolos por conta da arrogância de seu então presidente.
Teria o Sr. Dario de Mello Pinto provocado o presidente do Bangu, Guilherme da Silveira, mais conhecido como Dr. Silveirinha. Falava este, numa reunião de praxe na Federação Metropolitana, na presença de outros presidentes e representantes dos clubes cariocas, de seus planos de contratar um grande jogador que pudesse concretizar seu sonho de elevar o time proletário a voos mais altos, fazendo excursões ao exterior por valores mais relevantes do que se conseguia naquela época.
O dirigente banguense, perguntado pelos presentes com que jogadores ele sonhava, virou-se para Dario e falou:
- Zizinho! Por quanto o Flamengo me venderia o craque?
- Estás louco! O Bangu não tem dinheiro pra comprá-lo, retrucou o rubro-negro.
- Mas diga quanto vale, todo mundo tem um preço.
O presidente do Flamengo hesitou mas lançou um valor exorbitante pra época (fala-se que nos registros foram 800 mil cruzeiros).
- Pois então ele já é do Bangu! disse Dr Silveirinha ao tempo em que preenchia um cheque e o deixava à mesa.
Diante do espanto de todos e o constrangimento do presidente rubro-negro, o mandatário da fábrica de tecidos que deu nome ao clube ainda orientou para que o jogador se apresentasse em seu escritório no dia seguinte para assinar o contrato.
Zizinho ao saber do ocorrido ficou muito irritado e triste pela forma como tudo se deu. Carregou pelo resto da vida a mágoa de ter saído dessa forma do clube de seu coração. Apesar da derrota da seleção na Copa, foi considerado o melhor jogador da competição. Traduzindo, o Fla perdeu na ocasião o "melhor jogador do mundo" por conta de um dirigente fanfarrão.
A transação incluía ainda a renda de dois amistosos entre Flamengo e Bangu a serem jogados no Maracanã. O primeiro aconteceu poucos dias após a Copa e o Flamengo ganhou por 3x1. Mas havia uma ressaca tão grande por conta do 'Maracanazzo' que o segundo amistoso acabou acontecendo em São Januário e os banguenses venceram por 4x2.
Cerca de um mês depois, em confronto dos dois clubes pelo Campeonato Carioca, o Bangu aplicou um inapelável 6x0, um dos gols marcados por Zizinho. Foi uma das vergonhas que passamos naquele ano, o Bangu terminou a competição em terceiro, atrás de Vasco e América. O Flamengo foi o sétimo. Conta-se que o Sr. Dario de Mello Pinto passou a ser execrado na Gávea.
Por que fui buscar esse episódio da história do nosso Flamengo nesse momento de turbulência que ronda os nossos ares? Porque ele marca bem o tipo de figura que já sentou na cadeira mais importante do 'Mais Querido do Mundo' sem ter a envergadura necessária que o cargo exige. E não foram poucos. E eles se articulam à espreita esperando a hora pra dar o bote. Torcem pro "quanto pior, melhor".
Nesse breve relato omiti uma versão do caso que fala em troca de favores pessoais/comerciais entre o então presidente do Flamengo e o pai do patrono do Bangu, naquele tempo membro do Ministério da Fazenda. Esse tipo de situação está mais próxima do que, infelizmente, presenciamos nas últimas décadas da história do nosso clube, então resolvi propositalmente esquecer pra não me irritar mais.
E fomos, caros amigos, pegos de surpresa - nós os simples mortais torcedores - com a notícia do bloqueio da verba de patrocínio da Caixa por conta de dívidas contraídas em gestões passadas, dessa vez mais precisamente na de Kleber Leite. Logo ele, que num gesto de 'ousadia' contratou em 1995 o "melhor jogador do mundo" para fazer parte do "melhor ataque do mundo" no ano do nosso centenário. Teria sido a remissão do pecado da venda de Zizinho, 40 anos antes. Mas não foi. Um gol de barriga destruiu aquele sonho.
E a conta da 'ousadia' demorou mas chegou. A impressão que dá é que ao adotar como princípio tirar o nome do Flamengo da lama, onde está há décadas, de clube
caloteiro, mau pagador, zoneado e varzeano, rejeitado até por boleiros medíocres, a atual gestão atraiu a atenção de todos os credores existentes. Parece história de vencedor de loteria que vê surgir de todo canto parentes de que nunca ouviu falar. Todo mundo quer tirar sua casquinha.
Não vamos tapar o sol com a peneira. Há falhas visíveis na atual gestão. Mas talvez sejam proporcionais às expectativas que depositamos nela. Há falhas desde a comunicação com a torcida, no planejamento do programa de sócio-torcedor, nos valores estabelecidos para os ingressos e principalmente na condução do futebol. Mas de repente paramos pra pensar, tentando lembrar como era nas gestões anteriores e - pelo menos no meu caso - começo a atenuar.
Afinal, como era a comunicação com a torcida? Havia programa de sócio-torcedor? Como fomos no futebol? Fomos muitas vezes campeões? Frequentamos alguma vez a zona de rebaixamento? Treinadores foram demitidos por maus resultados? As escolhas eram as mais adequadas? Os salários andavam em dia? Os mais exigentes retrucam "Mas os 'azuis' não vieram pra mudar isso? Não foi esse o discurso de campanha?".
O que você acha, o saldo dessa gestão é positivo ou não é? A minha resposta seria: depende do tamanho do seu Flamengo. Com que Flamengo você sonha?
Vou abrir um parêntese.
Em 2012, por conta do episódio de Assis levando camisas da loja da Gávea, fiquei com sangue nos olhos com um misto de vergonha e indignação. Envergonhado da
diretoria que tínhamos e indignado pelo gesto absurdo do irmão-gigolô de Ronaldinho Gaúcho, que acabara de "fazer e andar" em campo no jogo contra o Inter e sair vaiado de campo.
Sob o efeito do fato grotesco, fiz uma charge que publiquei no meu perfil do Facebook. Meu camarada Rodrigo Rodrigues viu, comentou com o Mauro Cezar que publicou no seu blog e divulgou no twitter. A charge apareceu nos programas da ESPN daquele domingo e no dia seguinte. Bombou no face também com muitos compartilhamentos, enfim, de uma hora pra outra eu tinha um número bem maior de seguidores e sem ter muita noção do que rolava, passei a fazer parte do bando de 'malucos' da FlaTwitter.
As reações da torcida nesse espaço virtual vão de um polo ao outro em segundos, numa esquizofrenia muitas vezes hilária e nonsense. Mas uma coisa temos que admitir. Se a gente vê ali algumas opiniões grotescas e sem noção, vê ao mesmo tempo uma turma sensata e que ocupa boa parte do seu tempo pensando no bem do clube. A essa turma é que eu encaminho um apelo contra o título desse despretensioso texto. Não permitam que as múmias do passado voltem a assombrar o Flamengo. É preciso fortalecer e permitir que o avanço pretendido pela nova diretoria se concretize.
Fecho o parêntese.
O futebol, razão da nossa paixão pelo clube, vai mal, enxergamos isso. Há problemas de elenco, de comando técnico, de falta de empenho de jogadores sem a menor identificação com a nossa camisa. Mas já passamos por situações parecidas e vamos sobreviver a mais uma crise. Eu poderia pesquisar e listar uma fieira de jogadores tão ruins ou piores que vestiram o manto em momentos difíceis como o atual mas iria levar tempo. Vou poupá-los disso.
E volto à pergunta. Com que Flamengo você sonha?
Com o Flamengo de antes, que contratava sem noção de como pagar e acumulava ações e mais ações na justiça, impedindo que os salários de jogadores e funcionários fossem honrados, em que a água da piscina vazava pelo ralo junto com milhões de reais por ano?
Eu não sonho com esse Flamengo, não. Eu sonho com um clube reconhecido e respeitado em todo o mundo da bola. Com estrutura compatível com o tamanho da sua massa de torcedores. Com um clube que acolha seus torcedores, seja como sócios ou simpatizantes, da forma que lhes seja possível, mas com dignidade. E mais do que nunca com um Flamengo que consiga atrair jogadores que conheçam a sua história, a sua importância e queiram honrar sua camisa. Se não for com uma técnica apurada, que seja pelo menos com seu suor e empenho. A torcida sabe muito bem reconhecer quando isso acontece.
Fiquei muito satisfeito com a posição firme do presidente Bandeira de Mello em resistir ao ataque em massa das múmias. E elas são muitas, travestidas até de
jornalistas bem informados das coisas que acontecem nos redutos mais secretos do clube. Essas pragas felpudas nunca ofereceram nada de construtivo ao clube mas seu oportunismo é inesgotável, proporcional ao espaço que ocupam num meio cada vez mais anti-profissional e interesseiro. É nesse ambiente que sobrevivem, enquanto reinar a incompetência e troca de favores.
Não vou comentar o episódio do André Santos. Não estimulo violência dentro e fora do campo. Mas tem muita coisa estranha nesse caso. Vou aguardar mais informações. Mas se ele sair do time já é um baita lucro. Coloquem qualquer um no seu lugar, de preferência alguém que ainda tenha uma carreira pela frente, que dependa do futebol pra pagar as contas e um mínimo de noção do que seja a camisa do clube.
Eu poderia escrever mais um quilômetro sobre os problemas técnicos do nosso time atual. Temos assunto suficiente pra isso. Mas a hora é de apoiar o time. E não custa lembrar que daqui a pouco vamos estrear na Copa do Brasil, se estivermos em posição melhor no Brasileiro a confiança será maior e teremos mais chances de avançar.
Os ingressos pro jogo contra o Bota estão mais baratos e acessíveis. É hora de convocar os amigos, esquecer o tumulto provocado pelas múmias e lotar o estádio.
Rubro-negros do bem, o Flamengo conta com vocês!
OCCUPY MARACA!
Saudações!
Paulo Sérgio "PS" @pausse
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